8 de junho – Dia Mundial dos Oceanos

O MAR -- FEMININO: AMAR "Há quem goste dele. Há os que lhe tenham pavor. De minha parte, gosto dele -- líquido e certo.

Há quem goste dele. Há os que lhe tenham pavor.

De minha parte, gosto dele — líquido e certo.

Gosto da água. Fui embalado e nutrido, acalentado e protegido por nove meses dentro dela, flutuando no mais amoroso dos oceanos: o líquido — amniótico — da mãe. (Os gregos davam o nome de “amníon” ao vaso onde se colocava o sangue dos animais sacrificados em favor de seus deuses. A palavra foi levada da forma do vaso para a forma de uma barriga grávida, pelo desenvolvimento do feto e consequente elastecimento da cavidade ou saco amniótico, onde o líquido, na medida do possível, não deixa o embrião colar-se a outras estruturas nem sofrer choques ou pancadas).

Gosto da água. Banho de chuva, de água de chuva nas bicas e nas poças, pois meninos e meninas de antigamente sequer imaginavam haver risco de doenças… e talvez por isso não adoecessem mesmo, ou pelo menos não assim tão facilmente…

Gosto da água. Eu dentro dela, ela dentro de mim — pois eu, e todo ser vivente que nem eu, escritinho a mim (sem a fealdade…), somos 70% água. E isto é também líquido e certo. Ciência, ciência, ciência. Ciência que nos informa que também o corpo da Terra é 70% água — água doce de rios e riachos, córregos e ribeirões, lagos e lagoas, águas acima de águas, como os “icebergs”, e águas abaixo delas, como os aquíferos e outras águas subterrâneas; águas salgadas ou salobras do oceano global e coisa e tal, que são os cinco oceanos (Antártico, Ártico, Atlântico, Índico e Pacífico) e todos os seus 66 mares e 28 mares internos, sem falar nos corpos d’água que a Hidrologia ainda não classificou como mar — o que não impede que suas águas sejam salgadas e componham o total de mais de 97% de toda a água do planeta. Será se é por isso que a “dolce vita” não é para todos tão doce assim…).

Gosto da água. Perto de mim, ao escrever ou no criado-mudo da imensa cama — um oceano de conforto… –, tem sempre uns três litros, nem um daqueles recipientes estrangeiros, uma cara jarra japonesa, na qual asseguram ter uns minérios ou qualquer coisa liberadores de íons “y otras cositas más” que dizem ser boas para a água, para a alma, para algo… Acreditei. Ainda não tenho o do que reclamar.

Gosto da água. Meninote ainda, chegava a atravessar de um só fôlego o rio Itapecuru quando este era largo, caudaloso, limpo, piscoso… Na margem oposta ao “porto dos homens”, silenciosamente eu derreava dulcíssimas canaranas para dentro d’água, para serem quebradas e os estalos não serem ouvidos pelo vigia da vazante, portador de uma espingarda com carga de sal, para amedrontar, afastar e mesmo atirar nos moleques… (Depois de quebradas, as canaranas eram amarradas com algumas de suas palhas, formando-se pequenas balsas sobre o corpo menino, o que nos fazia flutuar e agilizar ainda mais o nado de volta ao outro lado…).

Também era o único menino nas vizinhanças da Palmeirinha e da Galiana, em Caxias, que tinha coragem de, nas pescas no Itapecuru, descer da canoa, afundar na água, prender o fôlego, acompanhar a linha de náilon e desvencilhar o anzol que se pregara em um tronco no fundo do rio ou buscar no fundo da loca o muçum que, fisgado, resistente, teimava em não sair de sua morada e “bunker”. Cuidadosamente, a partir de um sulco, vinco, um desnível qualquer próximo à cabeça daquele peixe sem escama, liso que nem quiabo, eu o segurava por breves instantes, tempo suficiente para voltar à canoa e jogar o “bicho” lá dentro. “ — Hélasse! Helate! Éguate!”, reagiam interjetivamente quem testemunhava a “operação”. (O muçum — ao qual insipientemente atribuíamos parentesco com as cobras — era escaldado, “ferventado”, e depois cozido ou frito. Ficava bronzeado que nem ouro velho, e era gostoso como peixe… pois peixe ele é…).

Por gostar de água, fui fazer mergulho submarino (mergulho autônomo) nas águas do Atlântico. Evoluí do “snorkel” para o tanque (de ar comprimido). Observar peixes. Visitar navios afundados. (Dispensei os treinamentos em água turva e para pesca submarina).

Depois que você chega a alto-mar, sem qualquer referência de praia, cidade, árvores, nada…, o melhor mesmo é, de sentado e de costas ou com o “passo de gigante”, cair dentro d’água e ir para o fundo — no meu caso, até quarenta metros. Enquanto a água de superfície pode mostrar-se revolta, escarpada, amedrontadora, lá embaixo, mais fundo, o mar é um ar líquido: água ultratransparente, calma, com cardumes dos quais você se aproxima e eles nãos lhe fogem. Você é só mais um animal marinho… — a Ciência diz que nossa origem é o mar, embora haja cientistas que diga que não, pois a composição físico-química da água marinha daqueles tempos ancestrais romperia as ligações nos níveis celulares ou atômicos.

Não há por que trazer para o mar medos que já não tenhamos em terra — e com os quais até nos acostumamos. O mar é perigoso? Ele é só o mar, mas o perigo está também na terra. O mar mata? Em terra mata-se mais. Navios afundam? Sim; poucos, mas afundam — como aviões caem e automóveis abalroam, atropelam, estraçalham… Tubarões e orcas são assassinos? Abra jornais, veja TV, consulte a Internet: gentes matam mais — de tiros e tapas, de murros e murraças, de socos e pontapés, de faca e foice, de fome e frio, de amor e ciúme, e também de desgosto e vergonha…

O mar apenas está onde está. Ele só reage.

O Dia Mundial dos Oceanos começou pelo Brasil, em 1992. Aprendamos a respeitar quem é maior — muuuuuuuuuuuuuuito maior — que nós. E mais forte. O mar estava aqui quando chegamos. E estará quando nós não mais estivermos…

Ainda que de longe, conheça o mar.

Aprenda amar.

EDMILSON SANCHES
edmilsonsanches@uol.com.br
Administração – Comunicação – Desenvolvimento – História – Literatura
PALESTRAS, CURSOS, CONSULTORIA

Edição: André Gomes

Nesse site utilizamos cookies para nossa análise e com isso oferecer melhorias em sua experiência de uso e navegação. Você concorda? SIM Leia Mais